Desde a pandemia, com bares e restaurantes fechados ou com limitações de atendimento, o serviço de delivery se consolidou como uma saída para manter negócios abertos. Esse mercado amadureceu. Segundo uma pesquisa da Abrasel com cerca de 2.176 empreendedores do setor, 71% atendem por delivery.
Mas para oferecer um bom serviço é preciso fazer escolhas estratégicas. Uma entrega mal realizada custa reputação, tempo e prejudica a experiência do consumidor.
Entre contratar uma frota própria de entregadores, terceirizar para os apps de delivery ou aplicar um modelo híbrido, como saber o melhor caminho para o seu restaurante?
Quando terceirizar faz sentido
Por trás de um bom serviço de delivery, existem inúmeras decisões que tentam equilibrar qualidade, logística, experiência e produto. Para Raphael Silva, especialista e criador do Lucrando com Delivery, realizar uma boa entrega é o sucesso da operação.
“Sempre falo sobre produto, embalagem e entrega. Produzir o mais rápido possível, embalar bem, despachar esse pedido para a expedição de forma eficiente. A entrega é o final do sucesso de toda essa operação”, destaca.
Nos casos em que o empresário opta por terceirizar a entrega aos apps, a tendência é a aposta em uma logística estabelecida, frota de entregadores disponíveis e velocidade na entrega.
Esse é o grande desafio de 2026: conseguir ser atrativo para os motoboysRaphael Silva
Gustavo Brunello, do La Braciera, uma das maiores redes de pizzarias napolitanas do Brasil, com sete unidades em São Paulo destaca o impacto do serviço de delivery no negócio. Para Brunello, optar pela terceirização da frota de entregadores foi o caminho mais viável em um período de crescimento acelerado da empresa.
"Nosso maior desafio era lidar com uma demanda muito elástica. Nossos finais de semana são extremamente fortes e o crescimento da La Braciera acontecia rápido. Manter uma frota própria capaz de absorver picos tão altos exigiria uma estrutura complexa, cara e difícil de gerenciar", explica.
De fato, os aplicativos de delivery oferecem vantagens para negócios com demanda irregular ou em fase de expansão rápida e a parceria com os apps pode ser um fator determinante. Mas a terceirização também tem limitações.
"Esse processo tem um custo: refazer pedidos, novas entregas, insumos e tempo da equipe. Já enfrentamos situações como pizzas reviradas ou mochilas inadequadas", compartilhou Brunello.
A quebra de expectativa gerada por turbulências nas entregas gera frustração no cliente e impacta diretamente na experiência com a marca, ainda que o problema esteja fora do controle direto da gestão do restaurante.
Segundo Bia Fraga, consultora de food service e membro do Grupo Mindhub, a experiência do delivery é mais uma etapa da padronização dos processos e esse é um dos principais diferenciais entre optar pela terceirização ou a autonomia.
"Se você tem logística própria, o motoboy tem que ter tantos treinamentos quanto a equipe de cozinha. A logística parceira não é sua, então você não pode padronizar nada", destaca.
A autonomia da própria frota
Em um caminho diferente de muitos empreendedores do setor, Leandro Kniphoff, sócio proprietário da JSK Burguers, uma das maiores redes de hamburguerias do Norte do Brasil com nove unidades, defende que "manter uma frota própria é o certo a ser feito".
Em entrevista ao podcast O Café e a Conta, o empresário contou que possui 98 motociclistas contratados a serviço da rede de hamburguerias. Jessica Santos Kniphoff também marcou presença na entrevista e destacou:
"A gente se preocupa tanto com atendimento presencial. Não faz sentido fechar os olhos para o atendimento de delivery. Quem é o garçom do delivery? O motoboy", afirma.
Para Kniphoff, no momento da entrega "o motoboy é o rosto da marca", carregando parte da imagem da empresa. E optar por construir a própria equipe de entregadores trouxe vantagens concretas: "Você consegue padronizar e ter controle. E na ponta do lápis é mais barato você pagar todos os impostos do que pagar por entrega terceirizada".
A frota de motociclistas da JSK dispõe de fardamento padronizado, bags enumeradas, GPS, seguro de vida e do veículo. "Temos uma série de mecanismos que fazem com que o motoboy trabalhe da forma correta e segura. Não faz sentido ter um motoboy que não tenha um fardamento padronizado, que não use sapato fechado, camisa de manga, que não tenha os EPIs e que não se preocupe com o tempo hábil", pontuou.
Assim como pontuou Brunello, do La Braciera, essa é uma logística complexa e que, certamente, demanda energia e gestão do empresário. Mas para reforçar seu argumento, o empresário do JSK apresenta resultados concretos.
"A reclamação dos motoboys é baixíssima. Pelo contrário, todas as operações têm avaliação 4.9", celebra o empresário.
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O novo cenário do mercado brasileiro de delivery
Como se os desafios de gestão já não fossem suficientes, o empreendedor ainda se encontra diante de um mercado de delivery em transformação no Brasil. Em 2025, a 99Food retomou as atividades no país que ainda recebe a chegada da Keeta, gigante do mercado de delivery chinês, a Meituan.
Para Rapha Silva, um dos grandes desafios para bares e restaurantes será, especialmente, o relacionamento com a frota de motociclistas. “Esse é o grande desafio de 2026: conseguir ser atrativo para os motoboys”.
O especialista ainda destrincha que “ter que disputar altos incentivos para as plataformas que chegaram no Brasil, que pagam muito acima [aos motoboys] do que é saudável para os restaurantes nesse período de entrada”. Ou seja, a parceria com os apps pode colocar na mesa novos prós e contras nessa relação.
Depois do período de adaptação das novas concorrentes, Rapha sugere que os motociclistas “vão escolher trabalhar para quem tem mais volume de entrega. É necessário avaliar muito bem onde você vai operar nesses primeiros 60, 90 dias na sua cidade".
Essa reflexão já tem alcançado a gestão do La Braciera. Segundo Brunello, “novos players mudam a dinâmica do mercado e aumenta a competição também pelos entregadores, o que naturalmente nos leva a reavaliar alternativas”.
Em uma mesma direção, Bia Fraga analisa que “vai ficar mais difícil a retenção de motoboy porque com muita demanda eles vão acabar ficando mais caros”. A recomendação de Fraga é "fazer bons acordos e quem usa logística parceira vai sempre ter que ter um plano B. A tendência é que isso se alinhe ao longo dos meses, mas o início deve ser caótico”.
Como identificar critérios e decidir?
A escolha entre frota própria e terceirização não tem uma resposta universal. É importante considerar o momento, estrutura e características do seu restaurante, além de avaliar o volume de pedidos, consistência do serviço e a disponibilidade de entregadores na sua região.
“Isso é um ponto importante: quando você é muito pequeno e tem pouco volume, não tem prioridade nos chamados dos apps. Outro ponto importante é a questão de custos do frete. Se o ticket médio é muito baixo, o custo do frete vai onerar muito o resultado dessa operação. Fica muito difícil”, explica Rapha Silva.
Vale destacar que alguns bares e restaurantes adotam modelos híbridos: mantêm uma frota própria para e complementam com apps nos horários de pico ou áreas mais distantes. Essa estratégia visa alcançar algum nível de equilíbrio entre consistência e volume, como é o caso do grupo La Braciera.
“Hoje, porém, entendemos que logística se tornou um dos pilares essenciais do delivery moderno e por isso, estamos avaliando modelos híbridos, combinando diferentes alternativas conforme o dia, região e volume de pedidos”, destacou Brunello.
Para quem avalia uma frota própria, o desafio é a negociação. "Preciso vender o objetivo que a operação tem de crescimento, gerando demanda, porque os motoboys querem ficar onde tem demanda”, continuou Silva.
Mas, independentemente das mudanças, uma questão ecoa acima de qualquer outra: manter a qualidade dos processos para liberar o pedido rápido e preservando a qualidade. “No final, você precisa ter um ótimo serviço. Tem que avaliar aquilo que vai fazer você conseguir ter mais unidades de motoboy para entregar mais rápido e ter sucesso”, finalizou.
A decisão deve considerar as características específicas do seu negócio, seus objetivos de crescimento e, principalmente, como você quer que seus clientes participem da experiência da sua marca, mas acima de tudo, considerar qualidade e rapidez.
