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Empreender do delivery ao salão: a expansão para o espaço físico

Começar no delivery e abrir o salão é um processo de expansão que demanda gestão, consistência e resiliência. Foto: Gemini IA.

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Entre empreender com o delivery a abrir o salão, existe um caminho cheio de desafios. Saiba como não repetir erros comuns nesse processo

Yasmim Paulino 12/08/2025 | 18:00

A gestão de bares e restaurantes tende a começar com um sonho: abrir um salão e ver a casa cheia. Mas essa ordem se inverte para muita gente que começa empreendendo com o delivery, em um espaço pequeno e um modelo mais “caseiro”. É nesse cenário comum em todo o Brasil que o desafio maior chega: a demanda aumenta e coloca os gestores de frente com a necessidade de abrir o salão.  

Durante a pandemia de Covid-19, o modelo de negócio de delivery se expandiu para muitas pessoas que sofriam com insegurança financeira e precisava garantir um dinheiro a mais na renda.  Gabriely Barbosa é professora em Divinópolis, interior de Minas Gerais e sempre gostou de cozinhar, especialmente hambúrgueres artesanais. De maneira inesperada, em uma conversa entre amigos, ela  e o marido, Werik Botelho, tiveram a ideia de abrir uma hamburgueria.  

“Na época, eu trabalhava em outra empresa, mas com toda a incerteza daquele momento, comecei a me preocupar com a estabilidade do meu emprego. O delivery surgiu como a única opção para o momento que estávamos vivendo, tendo em vista o distanciamento social”, detalha a empresária. 

A hamburgueria T-Brothers foi criada pelo casal em um contexto social extremamente sensível. “Eu precisava encontrar uma alternativa para complementar a renda e garantir alguma segurança”, relembra Barbosa. O que era para ser apenas uma renda extra para família, tornou-se um negócio próspero e a demanda dos clientes por um espaço físico foi incontornável.  

A cozinheira de comida coreana, Priscila Jung, também passou pela mesma experiência. Em 2020, pouco tempo  após começar o período de quarentena no estado de São Paulo, Jung decidiu começar a vender algumas marmitas de bibimbap, famoso prato tradicional coreano, para segurar as contas daquele mês. "Eu comecei na pandemia e não tinha muita opção. Ou eu começava pelo delivery, ou pelo delivery”.   

Eu comecei na pandemia e não tinha muita opção. Ou eu começava pelo delivery, ou pelo deliveryPriscila JungAssim como outros muitos outros empreendedores do setor que começam um negócio sem experiências antecedentes na área de cozinha e gestão, Jung trabalhava com profissões totalmente diferentes como artes e audiovisual.  

Brasileira e filha de coreanos, Jung também começou cozinhando em casa e tem um perfil nas redes sociais famoso por compartilhar receitas da culinária coreana, especialmente de kimchi, outro famoso prato coreano feito com vegetais fermentados. Atualmente, é cozinheira e dona do Jung Jib, em São Paulo.   

“Foi um jeito bom de ter esse processo de mudança de carreira mais controlado. Fui me entendendo na cozinha e na organização. Sou bastante metódica, então, pude ir começando a entender processos”, explica Jung. 

Delivery como estratégia inicial 

Além da necessidade, o delivery também se consolidou como um ponto de partida estratégico para novos empreendedores. O que permitiu que  muitos deles testassem suas ideias e construíssem uma base de clientes leais com baixo custo inicial.   

Abrir as portas exige investimento de recursos financeiros, psicológico e emocional dos gestores e de toda equipe. “O investimento inicial para um espaço físico é muito alto: aluguel, reforma, móveis, etc. A gente sabia que abrir um espaço ia muito além de simplesmente ter mesas”, destacou Barbosa.  

Para Jung, os processos foram uma das principais demandas de adaptação. Criar uma ordem para o preparo da comida preservando a consistência na qualidade do serviço se mostrou muito mais desafiador do que pensava. “Eu fazia só por encomenda e é bem mais tranquilo do que uma cozinha que tem demanda recorrente"

Para ela, começar pelo delivery serviu também para se preparar para todo o trabalho de abrir um restaurante. “No geral, acho que se eu tivesse aberto o restaurante de cara, talvez eu tivesse traumatizado para sempre e eu não tivesse até agora trabalhando nesse setor". 

A cozinheira Priscila Jung posa com um dos pratos servidos em seu negócio, a gyoza. Foto: Redes Sociais

 

Mudanças na equipe e no atendimento 

Barbosa compartilha que a prioridade e a aposta para a equipe da hamburgueria tem sido o diálogo com o cliente. “No delivery, o atendimento é indireto. Por isso, agora que abrimos o espaço físico o foco principal tem sido acolhimento, atendimento ao público e agilidade. Nosso espaço é bem pequeno, mas muito aconchegante e com o padrão de qualidade que já tínhamos no delivery”. 

Para o restaurante de comida coreana, ouvir o público tem sido a principal estratégia para manobrar a falta de tempo. “Não teve muito tempo para treinar a equipe e o meu dinheiro estava acabando. Havia uma urgência para abrir. Eu cheguei a fazer um soft para amigos e família que foi como um dia para treinamento, mas no geral, foi muito mais a construção através de feedbacks”, contou Jung.  

O que é preciso para abrir o espaço físico? 

Começar pelo delivery ou pelo salão: independente da trajetória, existem pontos em comum que todo empreendedor precisa se preparar. Planejamento financeiro, pesquisas de público, treinamento, aluguel e a localização do ponto são fatores decisivos no futuro da gestão do restaurante.  

Victor Macambira, diretor comercial e fundador da GASS Company, destacou a reflexão sobre o quão benéfico esse processo vai ser para o negócio. “Abrir uma operação de salão vai aumentar o canal de vendas, obviamente você tem mais receita e melhora a sua margem de lucro e fomenta seu crescimento. Mas ao se deparar com essa situação, você tem que se preparar. No final, ganha o negócio que tem o melhor modelo de gestão”, comentou Macambira. 

No final, ganha o negócio que tem o melhor modelo de gestãoVitor MacambiraAntes de pensar em alugar um espaço, o indicado pela contadora Júlia Santos é observar pontos estratégicos que envolvem a viabilidade da abertura do salão, entre eles, a concorrência, a localização, valor do aluguel e o público em potencial.  

Com as respostas em mãos, é hora de sentar e fazer contas com um profissional da área contábil. “É o momento de estimar o faturamento que pretende ter, mas analisando que existem despesas e custos. Ou seja, faturamento não significa lucro”, explicou Santos. 

No caso da hamburgueria T-Brothers, Barbosa viu o negócio crescer muito mais do que imaginava e o fator planejamento financeiro se tornou um peso.  

“Um grande erro foi não me planejar financeiramente com mais antecedência para o crescimento. Como tudo aconteceu muito rápido e de forma inesperada, fui tocando o negócio apenas como renda extra. Quando percebi que o volume estava crescendo e os clientes estavam pedindo por um espaço físico tive que buscar um planejamento financeiro imediato”, conta Barbosa. 

Entre tantos deveres de casa, Jung compartilhou que o Plano de Negócios foi um dos processos mais longos e importantes para a abertura do restaurante.  

“Durante bastante tempo, eu me debrucei sobre muitos aspectos da operação antes de começar. Muitas coisas não têm nada a ver com a realidade, inclusive a projeção de faturamento. Eu achei que faturar muito mais, mas foi muito bom ter tirado tempo para pensar em muitas coisas. Porque mesmo tirando tempo não tem como pensar em tudo, mas pelo menos eu pensei em boa parte”. 

Os desafios de abrir o salão se desdobram em várias camadas da gestão: pesquisa, cardápio, planejamento financeiro, treinamento, operação e resiliência. Como reforça Macambira e a experiência dos empreendedores que contribuíram com esse texto, o processo de transição se resume em um teste de equilíbrio de consistência, qualidade e estratégia de gestão de negócios.

“O maior desafio é equilibrar a operação de cozinha e de salão sem que você perca o seu tempo de entrega e o padrão de qualidade, sem impactar negativamente a experiência do cliente”. 

 

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