Em uma esquina despretensiosa do bairro Santa Cecilia, em São Paulo, um bar com nome inspirado nos miúdos tem conquistado os corações e os estômagos dos fãs de boteco na cidade. O reconhecido Moela Bar tem se destacado desde as escolhas do cardápio à maneira de fidelizar os clientes com um atendimento informal e acolhedor.
Em 2020, Rômulo Morente, churrasqueiro, chef e sócio-proprietário do Moela, inaugurou a casa com a intenção de construir um lugar que carregasse a essência dos botequins – dos quais é um grande frequentador – mas que também incorporasse elementos contemporâneos.
Não à toa, o ímpeto de empreender surgiu enquanto frequentava um dos seus lugares preferidos de Belo Horizonte. “Um dia em que eu estava no Bola Bar, que é um bar que eu gosto muito, para dar um curso de churrasco na cidade. E nesse dia eu falei: 'eu quero fazer o meu boteco’”, conta Morente.
Depois de trabalhar em diversos restaurantes, passou 10 anos vivendo de churrascaria. "Eu participava de todos os festivais grandes, churrascadas e fazia caterings de casamentos. Cozinhei em diversos países e dava cursos de churrasco em muitos lugares do Brasil”, conta.
Direto ao ponto, o convite habitual feito nas redes sociais do Moela é “venham com fome e com sede”, acompanhado da fotografia de um bolinho suculento ou uma cerveja gelada. Essa união saudável do bar entre o tradicional e o novo se materializa, principalmente, nas escolhas do cardápio, que transita entre diferentes opções de bolinhos fritos e pratos clássicos de botequins como a própria moela, língua e a rabada. “Basicamente, usamos produtos populares que não são caros e transformamos em uma comida muito boa. É esse o principal objetivo do Moela”, destaca Morente.
Apostar em um bar que incorpora a comida tradicional do botequim não é uma aposta simples. Para Morente, existem pontos positivos e negativos nessa relação. "Um lado bom é que você acaba "nichando” para pessoas que gostam de comer bem e gostam de comer de tudo. Você não fica naquele público muito “filé com fritas”, “batata com cheddar e bacon”.
Mas, por outro lado, o chef destaca que “existe uma rejeição gigante e não é todo mundo que come. Acho que em BH as pessoas comem muito mais e são mais abertas para isso”. Em contraponto ao público mais aberto da capital mineira, Morente destaca o cotidiano acelerado de São Paulo, que impacta na forma como as pessoas se relacionam com a comida. “Em São Paulo, pela velocidade que a cidade vive, acho que as pessoas migraram para comidas mais expressas e foram deixando essas outras um pouco de lado”, analisa.
Apesar de investir na gastronomia do botequim e reconhecer os pontos controversos da escolha, Morente ressalta:
“Apesar da gente chamar Moela, por exemplo, não é a moela da casa que a gente mais vende. Tem gente que vem porque ama a moela, língua, rabada, bochecha e tem outra turma que vem pelos bolinhos que são muito bons também”.
Entre altos e baixos
O Moela já foi reconhecido com o Prêmio Nossa de Bares e Restaurantes, realizado pelo portal de lifestyle do Uol, e premiado como melhor boteco da cidade de São Paulo pelo Datafolha, em 2025. Além da comida, os prêmios avaliam também o atendimento e o ambiente, dois grandes atributos do Moela.
É uma comida simples, um lugar para se sentar na calçada, para você furar a bolha e conversar com todos os tipos de pessoas Rômulo Morente
Em sintonia, Bianca Sales, sócia e gerente de operações do Grupo Moela, destaca que o fator acolhimento foi um fio condutor na construção da identidade do negócio.
“Desde o início, a ideia do Moela foi criar um bar com alma, um lugar onde as pessoas pudessem comer e beber sem formalidades. Daí em diante, a marca foi se moldando naturalmente. Tudo foi pensado para ser democrático, autêntico, e divertido do cardápio ao atendimento”, explica Sales.
Mas antes de se tornar um sucesso de popularidade e reconhecimento, o Moela enfrentou um período duro na estreia, compartilhado por inúmeros donos e donas de bares e restaurantes em todo Brasil. O salão abriu no fatídico ano de 2020. “A gente ficou um mês aberto e veio a pandemia”, conta Morente. Assim como muitos outros estabelecimentos, o Moela viveu a frustração e instabilidade financeira que a pandemia provocou.
“Na pandemia, a gente teve que demitir alguns funcionários e ficava eu na cozinha com mais um e o delivery. Sobrevivendo como dava, né? Foi um ano e pouquinho de sofrimento bruto. O primeiro mês de casa foi um sucesso muito grande, uma lotação que a gente tem nos melhores dias de hoje e parecia uma festa de cinco anos do Moela. Era todo dia muito cheio”, explica Morente.
Apesar desse momento ter frustrado todo o sucesso que o Moela adiantava nos primeiros dias de salão, o pouco tempo de contato com o público e o delivery de comida criaram uma expectativa grande.
“E acho que isso pode ter ajudado em algum momento. Muita gente foi, conheceu e amou. E muita gente não conseguiu conhecer e durante esse tempo recluso em casa, acho que gerou uma expectativa de conhecer assim que as coisas voltassem ao normal”, conta o chef.
Depois de cinco anos, a casa não só tem alimentado as expectativas do público como também expandido a operação. A segunda unidade do Moela foi inaugurada em 2022, no bairro Pinheiros e a terceira ganha vida ainda em 2025 no bairro Vila Mariana, todos em São Paulo. Mesmo colhendo bons frutos após um período difícil, tocar um bar é aprender a conviver com o improviso.
“Eu falo que sempre viver nos bares é viver no ao vivo. Não adianta, você pode estar com tudo certinho, sempre tem algum B.O para acontecer. Desde metanol, Ozempic, pandemia a dias de chuva que te deixam sem luz no sábado”, desabafa Morente.
| A estufa é elemento essencial do botequim e compõe o balcão do Moela. | Foto: Divulgação Moela Bar |
A proposta de ser o que o bar já é
Antes de abrir o Moela, Morente e alguns amigos fizeram uma verdadeira pesquisa de campo por diversos bares que são referência no assunto para ele. Segundo o chef, ele e os amigos passaram pelos famosos: Bar do Luiz Fernandes, Bar do Leo e outros clássicos da cidade. Em BH, seguiram pelo Bar do Careca, Bar do Bigode e alguns mais similares à proposta do Moela como o Nada Contra e o Pirex.
Para ele, a definição de um bar passa pela maneira como as pessoas conseguem criar relações íntimas e espontâneas com o espaço. "Você vai ao boteco, conhece o dono, frequenta toda semana, então isso era uma coisa muito importante para termos no nosso serviço: algo informal, do jeito que eu sou e do jeito que a gente quer que as pessoas se sintam à vontade”, explica Morente.
O tom de informalidade no atendimento e o ocupar a calçada vem com o desafio no treinamento de equipe. Para Sales, transmitir ao colaborador que informalidade não é desleixo exige um trabalho contínuo. “O atendimento do Moela é leve, espontâneo e próximo, mas sempre com profissionalismo e respeito. Formar essa cultura levou tempo porque envolve treinamento, escuta e convivência”.
| Os diferentes bolinhos recheados estão entre os mais pedidos do cardápio. | Foto: Divulgação Moela Bar |
Nesse sentido, o Moela aposta no simples que, no fundo, entrega muito. Todos esses elementos já estavam no radar dos donos de bares, como analisa Sales, “Hoje, o cliente valoriza mais a coerência da marca, o ambiente, o atendimento, a música, tudo precisa conversar entre si. Também notamos que há uma busca maior por acolhimento, por experiências que pareçam reais e não montadas para a foto”.
Em tempos em que estamos cada vez mais isolados em distrações algorítmicas, a busca por conexões reais e autenticidade abre espaço para negócios que convidam o cliente a uma comida simples e bem-feita em um espaço aberto que aposta em ocupar as ruas e desenvolver o diálogo.
“O Moela se destaca porque tem verdade. É um bar que não tenta ser o que não é. Nossa força está na consistência, no cardápio, no ambiente, no atendimento sem pose e numa comunicação que reflete exatamente quem somos. É um lugar que entrega o básico muito bem-feito e isso, no fim das contas, é o que mais marca quem passa por aqui. A simplicidade com identidade é o nosso diferencial”, resume a gerente de operações.
