Para investir em um novo negócio é fundamental ter objetivos e metas, conhecer e avaliar riscos e trabalhar a gestão com excelência em busca do sucesso. A opção por uma franquia atrai investidores por ser um modelo que traz um negócio consolidado e uma marca forte, já conhecida pelo consumidor. O que não exclui o trabalho de gerir com responsabilidade.
A Revista B&R ouviu especialistas do setor, como franqueadores em diferentes nichos do segmento de alimentação, que podem inspirar novos investidores no segmento de franquias, assim como auxiliar restaurantes independentes a conquistar mais excelência em seus processos.
“Acredito que os restaurantes independentes podem — e devem — se inspirar no modelo de franquia. Padronização de processos, clareza de indicadores, cultura de atendimento, controle de estoque e treinamento contínuo, tudo isso pode ser aplicado sem que a empresa se torne uma franquia formal”, diz Neander Souza, especialista em franchising.
O setor de franquias no país caminha muito bem. Segundo dados divulgados pela Associação Brasileira de Franchising (ABF), a categoria está presente em 69% dos mais de cinco mil municípios brasileiros, com crescimento de 13,5% em 2024 e 8,9% no 1º trimestre deste ano, chegando a vários mercados e nichos com uma diversidade de formatos e valores de investimento. Mas como deve ser a relação entre franqueadora e franqueado para o sucesso do negócio?
“A franqueadora tem a missão de liderar com visão, entregar suporte real, tomar decisões baseadas em dados e ouvir o campo. Já o franqueado precisa entender que ele não é apenas um operador: é a extensão da marca. Quando os dois lados atuam com responsabilidade compartilhada, o crescimento vem de forma natural e sustentável”, diz o especialista.
Segundo ele, o problema é que, em muitas redes, falta esse alinhamento. O franqueador acredita que basta formatar o modelo, e o franqueado acha que comprou um “negócio pronto”. Nenhum dos dois está certo. Franquia não é um atalho, é uma estratégia de expansão estruturada que precisa de diálogo, presença, método e acompanhamento contínuo.
“O sucesso de um franqueado vai além do investimento inicial”, reforça Júlio Bertolucci, diretor de franquias da Água Doce, fundada em Tupã - SP. Com 35 anos de experiência no setor de franquias, ele explica que é fundamental seguir os padrões estabelecidos pela franqueadora, participar ativamente da operação e buscar sempre melhorar seu desempenho. Saber liderar a equipe e gostar de se relacionar com pessoas são diferenciais para um bom franqueado.
“A franqueadora entrega o know-how, estratégias, fornecedores, ferramentas de gestão, marketing ativo e outros insumos, mas o franqueado na ponta é o grande responsável pelo sucesso do negócio”, diz Bertolucci.
Não existe fórmula pronta
“Um dos erros mais comuns que vejo no mercado é o franqueado que inicia uma franquia achando que comprou uma fórmula de sucesso pronta, quando, na verdade, está assumindo a responsabilidade por um negócio que exige gestão diária, atenção aos detalhes e maturidade empreendedora”, diz Souza.
O especialista em franchising cita alguns pontos de atenção para quem quer investir numa franquia. O primeiro deles é a compreensão profunda do modelo, já que nem toda franquia é adequada para qualquer perfil de investidor. Antes de pensar no retorno, é essencial entender se o tipo de operação combina com a rotina desse investidor, seu estilo de liderança e sua capacidade de execução.
É imprescindível, segundo ele, que o candidato leia a COF - Circular de Oferta de Franquia acompanhado de um advogado especializado. “Muitos pulam essa etapa achando que se trata apenas de burocracia, mas a COF traz pontos críticos sobre histórico da rede, suporte, investimento total, taxas e riscos envolvidos”, enfatiza.
A COF é um documento valioso que, obrigatoriamente, deve ser entregue ao potencial franqueado antes da assinatura do contrato. Nesse documento, além de informações importantes da franqueadora, possui uma lista completa de franqueados atuais e ex-franqueados que se desligaram da rede. “Fazer uma consulta com alguns deles é fundamental”, orienta Bertolucci.
O presidente do grupo Bar do Adão, do Rio de Janeiro – RJ, Maurício Costa, destaca a importância de ficar atento aos aspectos legais e contratuais da relação franqueador – franqueado e não abdicar do apoio de um advogado especialista.
“É fundamental contratar um advogado para analisar os documentos que possuem termos jurídicos específicos, muitas vezes acima de 80 páginas de contrato. É uma etapa fundamental para ficar ciente de todas as regras, direitos e deveres dessa relação contratual para a qual você está se propondo a investir. Sabemos que, na maioria das vezes, esse dinheiro do investidor é o dinheiro de uma vida, é um dinheiro juntado a muito custo, então leve muito a sério isso e não deixe de contratar um advogado”, aconselha.
Comunicação e suporte são fundamentais
Para o especialista em franchising, também é fundamental investigar como é o suporte prestado pela franqueadora, na prática, e não apenas o que está prometido em papel. Isso se faz conversando com franqueados da rede, visitando unidades em operação e observando como a franqueadora lida com os desafios do dia a dia. Além disso, ele explica que “outro ponto negligenciado por muitos é o planejamento financeiro. Entrar numa franquia apenas com o valor do investimento inicial pode ser um erro fatal. É preciso ter capital de giro para manter a operação saudável até o ponto de equilíbrio”, diz.
Uma relação saudável e de qualidade entre franqueadora e franqueado é um pilar fundamental, como explica Maurício Costa. São pilares fundamentais sobre esse relacionamento que apoiam e aumentam o sucesso do negócio. O primeiro deles é a facilidade de comunicação com os franqueados.
“Temos o conselho de franqueados, que é um conselho representativo com alguns franqueados que representam e heterogeneidade da rede, ou seja, temos franqueados com loja em shopping, com loja em rua, em diferentes zonas da cidade - tudo para ter opiniões mais abrangentes e diversas. Nas reuniões de conselho debatemos, discutimos e conversamos sobre estratégias de marketing, de campanhas de vendas e de melhorias operacionais, tudo com intuito de maximizar a operação, sua eficiência, produtividade, qualidade e rentabilidade”, explica.
Na Água Doce, a comunicação entre franqueadora e franqueados também é uma das prioridades para atingir o sucesso do negócio. “Ter uma escuta ativa é fundamentam e por isso temos vários encontros com a rede, convenções e comitês de gestão, entre outros. O franqueado é sempre ouvido e muitos insights importantes são recolhidos dos franqueados e colaboradores”, diz Bertolucci.
Ele ressalta também que a principal força da Água Doce está na comida farta, preço justo, hospitalidade e qualidade dos produtos, que são citados muitas vezes nas pesquisas de satisfação junto aos clientes. “A brasilidade como diferencial temático é outro ponto fundamental. Assinamos como Sabores do Brasil e procuramos sempre entregar em cada prato e porção um pouco da cultura e tradição brasileira”, detalha.
A franqueadora Bar do Adão também presta suporte 360º graus para os franqueados que envolve desde o treinamento inicial intensivo e detalhado para a abertura da loja antes da inauguração, durante as obras e no treinamento de equipe e, após esse período, realiza mensalmente no mínimo duas visitas em loja com consultores de operação verificando toda dinâmica de cozinha e salão. O time de marketing avalia oportunidade de comunicação de trade marketing em loja e as visitas de especialistas ajudam na construção dos relatórios financeiros de controle.
“Possuímos um suporte em todas as frentes necessárias para um negócio saudável financeiramente, com excelência operacional e longeva, maximizando o retorno do franqueado”, diz.
Gestão da Marca
Uma das mais recentes franqueadoras no setor é o Nanica, que nasceu em 2018, quando os amigos Leo e Tito, que se conheceram na faculdade de gastronomia em Curitiba–PR, decidiram apostar em um sonho e abriram uma pequena loja com porta de cor amarela na Rua Augusta, em São Paulo. Com apenas R$ 15 mil em mãos, eles começaram a vender o conhecido banoffee, uma torta de banana com chantilly e doce de leite, sem imaginar onde chegariam.
Segundo a CEO da marca, Thais Costa, no começo, foi difícil: vendiam só oito tortas por dia, bem abaixo da meta, e a cor da loja foi a mais barata que encontraram. Mas o sabor conquistou quem provava, e as coisas começaram a acontecer.
“Tivemos o incentivo de Tiago Abravanel, que acreditou no nosso potencial, virou nosso embaixador e depois sócio, ajudando a espalhar o Nanica para cada vez mais pessoas. Em 2019, abrimos a segunda unidade voltada para delivery e, logo depois, começamos a expandir com o modelo de franquias”, diz. Hoje, são mais de 50 unidades em várias regiões do Brasil, com faturamento de R$ 53 milhões em 2024.
A gestão da marca no Nanica é feita de forma muito próxima e estratégica, segundo Thais. “Temos um cuidado grande para manter a identidade e o padrão de qualidade em todas as unidades, garantindo que a experiência do cliente seja a mesma em qualquer loja do país”. A franqueadora oferece suporte constante aos franqueados, tanto na operação quanto no marketing, ajudando na comunicação local e nas ações de divulgação, sempre alinhadas com as campanhas nacionais.
Além disso, o cardápio é adaptado para a realidade de cada franqueado, trazendo opções que façam sentido para cada região do país e respeitando as preferências do público local. “Dessa forma, conseguimos manter a força da marca e, ao mesmo tempo, nos conectar de verdade com os consumidores de cada cidade”.
Para Souza, a franqueadora precisa atuar como guardiã da essência da marca, protegendo a identidade visual, a proposta de valor e, principalmente, a experiência que o cliente tem em qualquer unidade. Isso exige muito mais do que manuais: exige cultura, coerência e atualização constante. Se a franqueadora não cuida da sua marca com inteligência, os franqueados acabam tomando decisões isoladas e o que era para ser uma rede se torna um aglomerado de unidades sem padrão.
“Por outro lado, quando a marca é bem gerida, ela se torna um ativo vivo, pulsante, que inspira confiança tanto no consumidor quanto nos franqueados. Marca não é só o que a gente diz, é o que a rede entrega na ponta”, finaliza Souza.
